o risco da água

Mãe Geral

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@1.uaíma

A água não é um elemento químico. Nenhuma dúvida quanto a isso, depois que foi esclarecido que ela é uma molécula feita de duas partes de hidrogênio e uma parte de oxigênio; isso depois de muitos estudos em mil laboratórios. Hoje, noutras obras vive a ciência, procura-se a fusão de elementos – a fissão deu no que deu: primeiro, mortes; depois, e até hoje, receios, desconfianças, desligamentos. Não há dormir.

@2.uaíma

Em qualquer feira de rua ou num mercado é certo que se vai ouvir alguma piada maravilhosa, algum eco de rastilho de pólvora, algum conceito que abalará várias estruturas; ouvem-se conceitos inesperados e até desconcertantes, o que nos faz pensar a respeito de tantos assuntos jogados no mundo, e temos de levá-los para casa, as mão cheias de molhes verdes, verduras, e os supérfluos de quase sempre, levando também o que não se previra. Às vezes aparece algum sermão da montanha, todo fora de lugar e hora.

@3.uaíma

Bustamante é um luthier aqui da região do bairro, portanto, hábil em desvendar o errado, as feridas de um violão, por exemplo, o meu, o qual ficou lá para um reparo no braço. Uma semana é o prazo, tempo o qual uso noutros afãs o que gastaria em ensaios, indo mais fundo noutras escravidões ou vícios meus e de outrens. Não penses nada fora do eixo, sou bom garoto, pergunte à minha Mãe Maria, ela dirá com certeza: “É um bom menino, muito organizado e estudado, só não vai nunca aos salmos, e muito menos é presencial na igreja, para a minha tristeza; sim, bom menino, meio desmiolado, bom amigo, bom filho.

@4.uaíma

Esqueceste a senha ? Sem entrada, sem diálogo possível ? Estás agora de nervos aflorados, porque sem passar abobrinhas não se fica impunemente. Hora é, mas a maldita senha, tua Dona, companhia de todo dia, escapou, nem uma anotação nalgum caderno, sequer junto às tatuagens. Diga algo: “Ora, tatuei até nome que hoje me dá solutos & solventes, mas não solução contra essa anomalia, contra estes nomes e mensagens que me dão vômito e até adiantam minhas cólicas, morrerei com estas insensatezes no corpo, feito gado ruim. Arrependimento vem tarde, os avós dizem.

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Darlan M Cunha

Carta à Mãe – n. 308

Digam-me, minhas amadas e meus caros: O que é que eu, um cisco, tenho mais a dizer ou fazer, senão babar e até chorar ?

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CARTA PARA Dona MARIA JOSÉ

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Mãe,

Hoje, segundona brava, dia predileto de uns, a partir do qual o Povão vai à luta, ou continua na lida, eu amanheci com a macaca, como se diz, e assim é que, café em punho, música, olhar de ócio descabido, dedinho do pé esquerdo com os ossinhos deslocados, devido a uma topada com a pesadíssima cama, cá estou, para lhe dar notícias e evitar – se eu puder – as notícias de sempre com aumentos daquilo e disso, e de mais isso e aquilo, hehe, só rindo para que eu mesmo não me interne na digna Pinel, por exemplo.

Dona MARIA, minha salina de onde retiro o sal para a luta cotidiária

eu fico pensando – e olha que pensar dói – no tamanho das suicidades nas quais vivemos, já quase todos mundo afora, andamos e viajamos, sabemos do que aqui se fala, e é notório que em breve as últimas aldeias pequenas, que hoje já são raras, serão comidas pelas monstrópoles, haverá uma só aldeia ainda mais gigante, de maneira que, num domingo ou feriado, para se ir à casa de uma das vovós e de um dos vovôs, terá de enfrentar umas três horas de lotação ou coletivo. Barbaridade. Mas Vó é Vó. Não irei, por não tê-las mais ao alcance de um abraço.

Tenho a Senhora, MÃINHA, cadarço que me amarra os sapatos, os calos, e me abre o pouco juízo

para me conduzir pelos mil e um labirintos cotidiácidos, cheios de minotauros e de outras bestas humanas. Afe! Ontem, saí para umas compras, assobiando águas de março, lá fui eu, alegre que nem um coelho quando noivo, sim, é verdade, só a Senhora me conhece de fato, além de eu mesmo, e assim me vi diante das bancas de mil tipos, seus proprietários algo macambúzios, ou tristes, porque os preços estão saltando mais do que canguru, e assim vendem cada vez mais caro, e para menos pessoas – e aqui é que que está o X da questão, lembrando aqui esse título de uma música do Noel Rosa.

Trisavó MARIA JOSÉ, meu cantinho de algodão, meu violão só música top

em abril a Senhora vai completar 91 anos, sendo que Nos 90, aí nos EUA, a Família imensa e muitos amigos e amigas desta Nação fizeram uma festa de dois dias, até porque, querida e respeitada como a Senhora é, todos e todas se lembraram que não é todo dia que a gente completa 90 anos, andando, rindo, cantando, sem diabetes, sem bengala, nenhuma cesária nos 10 partos, e por aí vai, sem contar nos rapazes lindos trabalhadores que se foram – e a Senhora, fortíssima, não enlouqueceu, não esmoreceu. Um espanto.

MÃE É MÃE, há mil anos digo isso, e me cumpro como filho meio relapso, mas…

pois é. A situação política está feroz, como não poderia ser de outra forma, se quisermos reajeitar a visão, reapurar o olfato e reconstruir as glândulas e os órgãos corporais da grande nação. Há cegos e cegas demais. A comida desce lenta, quase de todo amarga, isso se diga de quem tem feijoão, sim, feijoão com arroz. Devagar, tudo terá de se ajeitar. O Mundo, sem o Brasil, vendendo e comprando e opinando duro nas mesas internacionais, o Mundo é algo assim parecido com o que o filósofo alemão Friedrich Nietzsche disse a respeito da Música: “Sem música a vida seria um erro.” E mais eu não digo.

Mãe de todos os prantos e de todos os muitos sorrisos familiares, doce de leite com coco ralado

vou me despedir, mas não sem antes dizer que o bambuzinho do qual a Senhora cuida há uns 35 anos, continua verde e teimoso que é uma beleza, ponho água em dias alternados. Fique tranquila, o barraco está brilhando – umas baratinhas renitentes por aí, formiguinhas no açúcar, enfim, coisa pouca. Matarei todas com um par de sapatos femininos bico fino que comprei num brechó. É calçar e atuar.

Beijos e abraços do tipo Anéis de Saturno para a Senhora, e para a molecada aí, deitando e rolando com a destemida e risonha Vovó. Mais e mais lembranças deste filho meio desmiolado, quase analfabeto, mas bom garoto

DARLAN

soturno

“Um grande país eu espero, espero do fundo da noite chegar“, da canção Clube da Esquina (n 1), MILTON NASCIMENTO

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Várias vezes escrevi, aqui e alhures, que nas feiras e mercados ouve-se o que deve ser ouvido, lá onde a sisudez e principalmente o riso campeia, onde a sátira social é soberana, e tome risos, família, após as compras necessárias, o balcão do boteco de quase sempre.

Há poucos dias, o assombro geral no país foi de causar taquicardia e outros graves reveses na saúde do soma e na estabilidade psíquica de gente indignada com a atitude de meliantes decerto com alguns reais para o bolso de cada qual, algo mais na corrente sanguínea, desancando propriedades na capital do País.

O fato de fardas e de desobrigados de farda, mas não desobrigados de agirem com os braços severos da lei, não comparecerem a tão grave e insultante acontecimento, não gerou dúvida da origem dele, seu cerne, na concepção infalível do Zé Povão, de Maria Ningres-nigres.

Ouviu-se que “o coturno em casa, descalçado” – entre outras raízes sóbrias da fala popular. Comprei pequis e couve, bebi uma caninha e apalpei nacos de queijo – da poderosa Minas Gerais e, por certo, do sobrolho feroz de todo o Brasil de, por ora, 223 milhões.

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Darlan M Cunha: foto e texto

showciedade: drone & whatsapp

névoa social

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@1.uaíma

Vive-se contente pelas facilidades, falsamente feliz no alcance de fatores nunca antes relevados, vindos do ar e do mar, sim, a showciedade é inquieta, e nos reflete de todo, e nem podia ser diferente, pois ela é o que fazemos dela. Posto isto, considerar-se vencido ou vencida no seu tempo de encantamento, ou não ? Em aberto, cada cual con su trabajo / con sus sueños cada cual – diz a canção da chilena Violeta Parra, que se suicidou num domingo (aos 49 anos), en la tienda La Reina.

Nas décadas mais recentes, dois inventos dominam a humanidade: o drone e o whatsapp, sendo que o primeiro tornou-se espião e detonador, e me faz lembrar Santos Dumont, que viveu temores parecidos em relação ao que, com ele e com os irmãos estadunidenses Wright, surgia: o avião. Mísseis são aviões. Amadas e Caros, o whatsapp é maravilhoso pelo fato de que envia e recebe, grátis, vozes, imagens e textos de pessoas amigas, com as quais se pode contar 25 horas por dia. Quanto ao drone, um invento que estava fadado à destruição do alheio, deu no que deu. Teu teto irá para os ares, talvez, hoje, o meu, e todos, mundo afora fingindo-se felizes. Não todos e não todas.

@2.uaíma

Ir ao Mercado ou à feira de rua é rir de graça, e é mais do que certo que o teu prisioneiro – o riso – saltará sobre bancas de frutas, de verduras, de peixes, no balcão tradicional de algum boteco, lá mesmo, após as compras, respirando relaxamento, família em punho, ou não, não interessa, rir é sinônimo de feira – e não de certo mercado, porque quem se preza nunca vende o próprio prisioneiro que é o riso autêntico, mas que há muito tempo está cada vez mais preso. Cuida-te, porque o infarto não dorme. Lembra que o solriso te ama.

Mercado Municipal MANOEL CURADOR – MEDINA, MINAS GERAIS.

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Mercado Municipal, 2

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Fotos e texto: DARLAN M CUNHA

GENÉSIO TOCANTINS: Nóis é jeca mais é joia: https://www.youtube.com/watch?v=Ugj24pivp48

SÉRIE: SOM > 2

O som do MERCADO MUNICIPAL de MEDINA (cidade onde nasci), MG

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O som entrecruzado de gentes, galináceos e passarinhos, o mercado vai fervendo sua mesmice de compras e vendas e trocas de mil conversas, encontros e despedidas, o mercado é leve e pesado, o bolso arde, é melhor esquecer e continuar a comer esses petiscos ali mesmo no balcão, depois das compras, perder a vazão da pressa, ora essa, “Quem corre cansa, quem anda alcança” – diz um ditado popular. Gente disposta na encomenda do requeijão, da farinha de rosca, vou levar essa manta de carne de sol, e também a manteiga em garrafa, maxixe, doce de banana, frutinha boa é umbu, verde e azedinha de boa, meta na sacola três quilos de fubá da roça, grosso, de macho na lavoura, duas cabaças, panela de pedra, para um nó final na visita ao mercado, levo no lombo do carro o som da viola do cego, porque no mercado é assim e mais, então, Som na Caixa !

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Darlan M Cunha: foto e texto

ELOMAR FIGUEIRA MELLO (músico, escritor, arquiteto e fazendeiro criador de bodes na região de Vitória da Conquista, BA): O PIDIDO. : https://www.youtube.com/watch?v=l4Z_HsbzgJI