Para o dia 13-04-2024 = 92 (Deus que espere mais 92 anos)

A Vovozinha continua “a mil” UM DIA antes dos 92 anos (OBS.: nessa foto ela tinha 89 anos, foto feita por mim aqui em casa em BELO HORIZONTE).

*

Todas as coisas de minha mãe estão em seus lugares, tudo limpo, asséptico como de costume, à espera de que ela vá para o Céu onde o famigerado e famélico e desonesto deus a aprisione. Calma, devagar com o andor: Dona MARIA JOSÉ está na cozinha neste agora. Sigamos. Todas as memórias de minha mãe estão em seus lugares, à espera de que ela regresse do Céu, no qual nunca cri. Estão no lugar específico na memória todos os seus pontos de cruz, suas pinturas a óleo em telas, suas pinturas sobre panos de prato, e os doces de tacho e carnes temperadas em gamelas, seu sorriso sobre os girassóis fez com que o sol quase perdesse o emprego, mas ela é generosa – eu disse É generosa porque ela disse ao sol para ele ficar e continuar a “alumiar”; veja que não conjuguei no passado ou pretérito, e sim no tempo presente, porque ela está ali na cozinha, faltando oito dias para que ela, ainda serelepe, complete 92 anos de uma existência quase irreal, por tanto trabalho, filhos na conta de dez, mais mil netos e netas bisnetas e bisnetos e tataranetas, essa Maria é de fato um espanto, é igual criança, não sossega, e se não tem serviço ela inventa. Este é o legado de minha Mãe Maria José, com lugar garantido no céu; assim é que deus, ladrão de Mães, este ardiloso contumaz, um tipo que é puro acinte à vida como este desqualificado é, ele que espere mais 92 anos. Hoje, eu, filho da mãe, e a mãe Dona Maria vamos almoçar trivial: carne moída, couve, arroz, moranga e quiabo, feijão preto. Salada de almeirão, rúcula e tomate cereja. Arrematar com doce de leite. Deus que espere.

>>>

All my mother’s things are in their places, everything is clean and aseptic as usual, . Calm down, take it easy: Dona MARIA JOSÉ is in the kitchen right now. Let’s move on. All my mother’s memories are in their places, waiting for her to go to heaven where the infamous, starving, dishonest god will imprison her. All her cross-stitches, her oil paintings on canvases, her paintings on dishcloths, and the potted sweets and spiced meats in troughs, her smile over the sunflowers made the sun almost lose its job, but she’s generous – I said generous because she told the sun to stay and keep “shining”; You see, I didn’t conjugate it in the past or past tense, but in the present tense, because she’s there in the kitchen, with eight days to go before she, still cheerful, completes 92 years of an almost unreal existence, for so much work, children numbering ten, plus a thousand grandchildren and great-grandchildren and great-grandchildren and great-great-grandchildren, this Maria is truly an amazement, she’s like a child, she doesn’t rest, and if she doesn’t have a job, she invents. This is the legacy of my Mother Maria José, with a guaranteed place in heaven; and so it is that God, thief of Mothers, this contumacious schemer, a guy who is as pure an insult to life as this unqualified man is, let him wait another 92 years. Today, me and my mother Maria José are having a trivial lunch: minced beef, cabbage, rice, strawberries and okra, black beans. Salad of lettuce, arugula and tomatoes. Top it off with dulce de leche. May God wait.

*****

UAÍMA

A ESTRUTURA DO SILÊNCIO é o contraste mais puro do que se vê do outro lado do mundo

Sossegado, um cidadão lê o mundo. ELE nem me viu fotografá-lo numa manhã de domingo, em BELO HORIZONTE, entrada da Praça da Estação Ferroviária, onde fica o MAO – MUSEU de ARTES e OFÍCIOS.

Em monstrópoles ou suicidades, o comum é ninguém notar nada, a não ser o próprio umbigo, filhos da MÃE PRESSA em que todos se tornaram. Uma pessoa pode morrer ao lado de outras, e ninguém se dar conta do fato, pois é preciso ir, as filas chamam, os degraus sociais fogem cada vez mais, é preciso ser, ter ou não ter, matar um leão por hora, engolir ene sapos todo dia. Taquicardia: odiamos você, ó garota sofredora.

O horror da suave trisavó =minha Mãe= ao ver e ouvir e sentir certos atos via TV. Desligar foi imperativo.

Não há dias gêmeos, Senhora, dias muito parecidos há, mas nunca de fato gêmeos, e assim cada um deles deixa seus rastros, seu pasto grávido ou nu de todo, via queimadas incêndios enchentes e rastilhos de pólvora. Senhora, Não chore ainda não, que nós temos um violão, e já vamos cantar, porque nós “Não viemos por teu pranto / nem viemos pra chorar / viemos ao teu encontro / estamos no teu altar. / Por seguir vosso caminho / que é também teu caminhar / na força do teu caminho / esperamos nos salvar / na terra como no céu, no sertão como no mar...”

OBS.: alusão a canções de Chico Buarque (Olê, Olá): https://www.youtube.com/watch?v=hUgOKkj-iBM, e de Geraldo Vandré (Na terra como no céu): https://www.youtube.com/watch?v=P2meimIHGsE

*

Para as vovozinhas que, assim como as netas e netos, bisnetas e bisnetos, trinetas e trinetos (caso de minha Mãe) sofrem a barbárie, e outras e outras…

Dona MARIA JOSÉ em casa, com a calma e a persistência de sempre, inabalável em sua fé, pura bondade (nessa foto, com 89 anos; hoje, com 91 anos).

*

Muitas e mais bodas adiante

todas num caminho só

o social não ditando de todo

normas de ser o que já se é

(eis a questão de cada um

sadio ou demente: ser ou

apenas querer ser é a questão)

normas com gente dentro

(onde tem gente, problemas)

cada qual com suas metas

buscando rumos originais

outros querem um eco integral

mas viver é mais do que isso

é preciso sentir-se parte da trama real

na renovada tragédia humana.

***

Darlan M Cunha: fotos textos

senões

molecada de Joaíma, MG (alguns anos da infância vivi aí… vida dura de boa)

*

Hoje, ela é um retrato nas paredes da memória, que não desbotou-se de todo, não. Bem se diz que quem não conhece o próprio passado, a própria história, o seu “pessoal e intransferível”, vai passar pela vida em branco, sem maiores ilações, considerações, mas muitos senões. Conceito duro, mas verdadeiro.

*

baú com coisas e fatos dentro

*

JOAÍMA, MG – Teatro EDUARDO ARAÚJO – fazendeiro, cantor da época da Jovem Guarda, junto com Erasmo, Roberto, Vanderléia, Vanderlei Cardoso, Renato e seus Blue Caps, Jerry Adriani, e muito mais gente boa que fez e faz parte abrangente da história da MPB.

Nesse mesmo teatro, que ainda não tinha o nome do filho famoso, subi pela primeira vez num palco, aos 7 ou 8 anos, roupa de marinheiro (o mar a mil km de distância) feita pela Mãe Maria José. Só podia ser. É como eu sempre martelo: Mãe é Mãe.

***

Darlan M Cunha

Carta à MÃE – n. 312

Creia: uma foto de ontem da Mãe – continua assim, e mais, aos 91. Eu já disse, e escrevi: “Carregue água na peneira para a tua Mãe, sem desperdiçar uma gotícula sequer.”

*

Carta à MÃE, n. 312

.

Dona MARIA JOSÉ, minha festa junina

ontem, sexta, onze horas, radiante, fui buscar meu violão no luthier da região, mas ele nem pegara no instrumento que eu levara até lá para um reparo no braço. Fui na data marcada. Voltarei amanhã, a pedido do profissional em questão, meio ressabiado, é verdade [eu].

Mãinha, árvore frutífera

vamos a outros temas, aos horizontes ainda possíveis, sim, o mundo é vasto. Hoje, irei ao mercado central buscar queijos cabacinha e canastra, gengibre, alho, cebola, salsa, coentro, rúcula, agrião, milho verde, ervilhas e açafrão, e o que mais eu me lembrar, mas é preciso ir com os braços para cima, onde os preços estão, puxá-los para baixo, estão cada vez mais nas nuvens, queixas aumentam, no semblante geral quase não há lugar para o patrimônio nacional do riso franco do povo brasileiro, sempre com um sorriso.

Mãe, meu colar de luz, mas severa, se preciso

portanto, prepararei algo sumido da mesa, embora seja prato algo trabalhoso. E assim, ainda que chova canivete, a onça beba pinga, o elefante passe pelo buraco da agulha, farei estrogonofe de frango, do meu jeito, e assim almoçaremos juntos este petisco com folha de louro, orégano, açafrão, ervilha, milho verde, azeitonas e azeite, leite de coco, toda essa mistura indo entre um Uai e outro, som de poucos decibéis na caixa, bem entendidos. Travessia ampla no dia, Águas de Março no dia, Flor do cafezal na caixa, Valsa n. 1, Cuanto trabajo, também esta linda canção da espanhola/venezuelana Gloria Martín [Madri, 1945].

Dona Mãe, de fé cega nos Altos desígnios

não foi nada agradável medicar a Senhora, há duas semanas, vítima de virose violenta, alta madrugada. Dias de prostração para quem é a antítese visceral de ócio. Recuperada, a Senhora continua levando sol e lua nas mãos, a vizinhança agradece, e nada direi da família, das bisnetas e trinetas já agora rindo à toa, para ficarmos nos pequenos.

Dona MARIA, meu pé de vento, estrela de vida inteira

somadas todas as crenças, lendas, tabus, catarse e outras referências, apostas, perdas & danos, todas as teimas, sismos e cismas quanto ao que há de mais benfazejo no mundo, o que posso responder, cheio de obviedade, senão que é a Mãe ? Então, para este fervoroso sábado, um eco muito bom no céu da boca, ou seja, estrogonofe com batatas.

Beijos e abraços do primogênito, meio desmiolado, semi analfabeto, não só um colecionador de fiascos, e sim um bom garoto perdido nos breus do mundo vasto e gasto Mundo.

DARLAN

o risco da água

Mãe Geral

*

@1.uaíma

A água não é um elemento químico. Nenhuma dúvida quanto a isso, depois que foi esclarecido que ela é uma molécula feita de duas partes de hidrogênio e uma parte de oxigênio; isso depois de muitos estudos em mil laboratórios. Hoje, noutras obras vive a ciência, procura-se a fusão de elementos – a fissão deu no que deu: primeiro, mortes; depois, e até hoje, receios, desconfianças, desligamentos. Não há dormir.

@2.uaíma

Em qualquer feira de rua ou num mercado é certo que se vai ouvir alguma piada maravilhosa, algum eco de rastilho de pólvora, algum conceito que abalará várias estruturas; ouvem-se conceitos inesperados e até desconcertantes, o que nos faz pensar a respeito de tantos assuntos jogados no mundo, e temos de levá-los para casa, as mão cheias de molhes verdes, verduras, e os supérfluos de quase sempre, levando também o que não se previra. Às vezes aparece algum sermão da montanha, todo fora de lugar e hora.

@3.uaíma

Bustamante é um luthier aqui da região do bairro, portanto, hábil em desvendar o errado, as feridas de um violão, por exemplo, o meu, o qual ficou lá para um reparo no braço. Uma semana é o prazo, tempo o qual uso noutros afãs o que gastaria em ensaios, indo mais fundo noutras escravidões ou vícios meus e de outrens. Não penses nada fora do eixo, sou bom garoto, pergunte à minha Mãe Maria, ela dirá com certeza: “É um bom menino, muito organizado e estudado, só não vai nunca aos salmos, e muito menos é presencial na igreja, para a minha tristeza; sim, bom menino, meio desmiolado, bom amigo, bom filho.

@4.uaíma

Esqueceste a senha ? Sem entrada, sem diálogo possível ? Estás agora de nervos aflorados, porque sem passar abobrinhas não se fica impunemente. Hora é, mas a maldita senha, tua Dona, companhia de todo dia, escapou, nem uma anotação nalgum caderno, sequer junto às tatuagens. Diga algo: “Ora, tatuei até nome que hoje me dá solutos & solventes, mas não solução contra essa anomalia, contra estes nomes e mensagens que me dão vômito e até adiantam minhas cólicas, morrerei com estas insensatezes no corpo, feito gado ruim. Arrependimento vem tarde, os avós dizem.

***

Darlan M Cunha